1) Avivamento – O que é?

Reavivamento é o sopro de Deus para tirar a poeira que foi acumulada no decurso dos anos, no período de tempo compreendido entre o último avivamento e o momento atual. Não importa a espessura nem o tipo de poeira. O reavivamento é uma obra de Deus, periódica e poderosa. Ele recoloca a igreja em seu primeiro amor, produz convicção e confissão de pecado, santifica e movimenta a igreja. Desperta o gosto e a disciplina de práticas devocionais particulares, como a leitura e meditação da Palavra de Deus, a oração, o desabafo, a auto-sondagem, a confissão espontânea de fraquezas e fracassos, o sentimento de carência de Deus e a vigilância pessoal. O reavivamento leva a igreja a redescobrir a pessoa e a obra do Espírito para dele se servir outra vez, como nos dias dos apóstolos.

Mesmo tendo um teor místico muito acentuado, reavivamento é muito mais que isso. É o motor de coisas novas, de realizações extraordinárias e de certa duração, na área da educação religiosa, na área de evangelização e missões, na área de socorro ao sofrimento humano. Forçosamente, o reavivamento sempre gera preocupação com os não-salvos pela graça de Deus e com os moralmente marginalizados. A história dos reavivamentos mostra que este sopro do Espírito induz os crentes a fazerem obras de caridade e a levantar a sua voz contra a injustiça social, seja ela qual for e custe o preço que custar.

(Entrevistas com Ashbel Green Simonton, p. 107.)

Outra definição de reavivamento aparece no mais recente livro de John Stott:

“Reavivamento é uma visitação inteiramente sobrenatural do Espírito soberano de Deus, pela qual uma comunidade inteira toma consciência de sua santa presença e é surpreendida por ela. Os inconversos se convencem do pecado, arrependem-se e clamam a Deus por misericórdia, geralmente em números enormes e sem qualquer intervenção humana. Os desviados são restaurados. Os indecisos são revigorados. E todo o povo de Deus, inundado de um profundo senso de majestade divina, manifesta em suas vidas o multifacetado fruto do Espírito, dedicando-se às boas obras.” (A Verdade do Evangelho, p. 119.)

2) Avivamento com Pães Asmos

Um avivamento com pães asmos é muito diferente. Ele exclui o velho fermento da maldade e da malícia. O velho fermento é o fermento do mal, da vida pregressa, da cultura pecaminosa da qual somos arrancados e para a qual morremos. O fermento da maldade e da malícia é o fermento da carne, do mundo e do diabo, que penetra na comunidade dos crentes e provoca mau testemunho, escândalo e contradições entre a palavra e a conduta.

Avivamento sempre foi aquecimento do fervor religioso, no sentido de santidade, pureza, renúncia (“não eu, mas Cristo”), vitória sobre o pecado, amor entre os irmãos, devoção pessoal, vontade de evangelizar, consagração ao Senhor. Era avivamento “com os asmos da sinceridade e da verdade” e não “com o fermento da maldade e da malícia”.

A ênfase principal hoje é outra. Não se fala em santidade de vida, mas em curas, sinais e prodígios, espetáculos, sucesso e prosperidade. O que poderia ser, dentro da soberania de Deus, mera conseqüência do avivamento, hoje é o que se busca em primeiro plano. A mudança é sutil, perigosa e deformante. É de influência mundana. Tem relação com a crise social e econômica. Assemelha-se demais com a situação da igreja de Corinto na época de Paulo, onde certos procedimentos pentecostais conviviam com o fermento da maldade e da malícia. Este fermente é que provocava as cisões, a soberba, a imoralidade, o escândalo, a bebedice, a incredulidade (alguns não criam na ressurreição dos mortos)e a carnalidade crônica dos coríntios, “chamados para serem santos” (1 Co 1.2). É a eles que Paulo propõe: “Celebremos a festa (a Páscoa), não com o velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia; e, sim, com os asmos da sinceridade e da verdade” (1 Co 5.8).

Quem está disposto a buscar um avivamento com pães asmos? Este é mais difícil, mais demorado e exige mais oração e muito mais negação de si próprio. Em compensação, é mais profundo, mais demorado e muito mais avassalador.

3) Avivamento sob o ponto de vista histórico

1. Sob o ponto de vista histórico, reavivamento é um período de tempo em que o Espírito Santo de Deus atua maciçamente no meio de um grupo de crentes de um determinado lugar, levando-o a buscar a Deus de forma intensa, deixando de lado a rotina, a frieza e a inércia, e usando-o de maneira fora do comum para o engrandecimento do seu reino. O avivamento em si pode durar pouco tempo, mas os efeitos que ele produz podem durar muito tempo.

2. Em geral, o reavivamento ocorre depois de um período de decadência moral e espiritual, depois da perda gradual e total do primeiro amor (Ap 2.4), depois das concessões feitas perigosamente à doutrina e à ética, depois de um vazio que se torna insuportável, depois de uma liturgia fria e repetitiva, depois de um púlpito seco e não cristocêntrico e também depois de certas tragédias de âmbito nacional ou internacional, provocadas por crises econômicas, epidemias, guerras e flagelos naturais.

3. Durante o reavivamento, a concepção de um Deus absolutamente santo gera convicção de pecado, arrependimento e mudanças. As Escrituras recuperam a sua autoridade de única regra de fé e prática. Volta-se à salvação pela graça mediante a fé e passa-se a acreditar outra vez que fora de Jesus não há salvação. Jesus Cristo torna a ocupar o lugar central na igreja e nos corações dos fiéis. Os crentes se enchem de ânimo e de alegria.

4. Porque a consciência social e a consciência missionária tomam conta dos crentes, surgem novas e muitas vocações para o ministério pastoral, para os campos missionários e para a filantropia. Como resultado prático, abrem-se novos seminários, novas agências missionárias, novas escolas evangélicas, novos ministérios e novas obras assistenciais, como orfanatos, creches e hospitais. As igrejas crescem em quantidade e em qualidade.

5. Embora o reavivamento conduza ao evangelismo, este é uma coisa e aquele é outra. “O evangelismo é boa nova e o reavivamento é vida nova. No evangelismo é o homem que trabalha para Deus, no reavivamento é Deus que trabalha de forma soberana em favor do homem… Toda a vida espiritual, seja no indivíduo ou na comunidade, na igreja ou na nação, é obra do Espírito Santo. Nenhum homem pode programar um reavivamento, porque só Deus é doador de vida.” (F. Carlton Booth, em “Dicionário de Teologia”, p. 76.)

6. O máximo que o elemento humano pode fazer é orar por um reavivamento, como fez o salmista: “Porventura, não tornarás a vivificar-nos, para que em ti se regozije o teu povo?” (Sl 85.6). Ou como o profeta: “Aviva a tua obra, ó Senhor, no decorrer dos anos, e, no decurso dos anos, faze-a conhecida” (Hc 3.2). Outra providência possível, já sob a ação do Espírito, é a passagem súbita ou gradativa da igreja de uma esfera carnal para a esfera espiritual, em que se colhe não as obras da carne, mas o fruto do Espírito.

7. Os reavivamentos mais famosos da história da igreja aconteceram na Europa e na América do Norte. Entre eles estão a Reforma Protestante (a partir de João Wycliffe, João Hus, Martinho Lutero, João Calvino e João Knox), o Reavivamento Morávio (com o conde Nicolau von Zinzendorf), o Grande Reavivamento do Século 18 (com João e Carlos Wesley e Jorge Whitefield), a série de reavivamentos ocorridos nas colônias americanas entre 1725 e 1760 (a partir de Teodoro Fredinghuysen e Jônatas Edwards) e os reavivamentos do século 19 (com Charles Finney e D. L. Moody).

8. Na esteira dos reavivamentos religiosos, há sempre alguma coisa espúria, que empobrece e desvirtua o movimento, embora não o impeça nem o danifique por completo. O historiador Welliston Walker lembra que, no clima emocional do início do século 19, insuflado por despertamentos religiosos, surgiram também “vários movimentos que representam significativos afastamentos ou distorções do modelo protestante evangélico” (“História da Igreja Cristã”, vol. 2, p. 279). Alguns deles só se mostraram perigosos vários anos depois. Hoje são grupos fortes e numerosos espalhados pela face da terra, como as Testemunhas de Jeová e os Mórmons. Quando esteve no Brasil, em 1952, o também historiador e avivalista J. Edwin Orr declarou que para cada grande reavivamento da história havia uma reação contrária, desde João Wycliffe (1329-1384) até Billy Graham.

4) Riscos de distorção em tempos de avivamento

A oração de Habacuque — “Aviva a tua obra, ó Senhor, no decorrer dos anos, e, no decurso dos anos, faze-a conhecida” (Hc 3.2) — é bem oportuna e sempre bem-vinda.

O cansaço, o desgaste, a rotina, o secularismo, o esquecimento, os desvios tanto de comportamento como de doutrina, o egoísmo, a descrença, o esfriamento do amor e do entusiasmo, a desobediência, o orgulho, o sectarismo e coisas semelhantes deixam a igreja em situação de miséria. E a brasa quase apagada exige um novo e vigoroso sopro do Espírito Santo. Então é preciso pedir que Deus visite constantemente a sua vinha e restaure o seu vigor, como suplica o salmista (Sl 80.14-19). O Velho Testamento e a história eclesiástica apresentam um sem-número de fortalecimentos poderosos e quase repentinos da vinha por meio da atuação do Espírito.

Porém, sempre há riscos em tempos de reavivamento. Já que estes problemas existem e são uma verdade histórica, não é demais tomar-se a necessária precaução. Não se deve fazer restrições ao Espírito, mas nem sempre o que se ensina e se faz é do Espírito. É costume pregar uma soltura total, sem qualquer tipo de questionamento, para não entristecer nem abafar o Espírito. Não é bem assim que a Palavra de Deus nos ensina. Por causa de toda essa ingenuidade e do sacrifício da razão, não poucos movimentos reavivalistas têm dado em nada, quando se não corrompem a ponto de criar movimentos heréticos. Não é à toa que Paulo fala em “retorno à sensatez” (2 Tm 2.26) e recomenda o bom senso (1 Tm 2.9-15). É preciso receber a palavra pregada “com toda a avidez”, mas também com a cautela dos bereanos, que examinavam “as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram de fato assim” (At 17.11). John Mackay lembra que “a entrega sem reflexão é fanatismo”, mas reflexão sem entrega é a paralisia de toda ação”. Embora inspirado pelo Espírito para produzir o terceiro Evangelho, Lucas empreendeu uma narração coordenada e em ordem da vida de Jesus, depois de ouvir as testemunhas oculares e “depois de acurada investigação de tudo desde sua origem” (Lc 1.1-4). Em seu livro “Crer é Também Pensar”, John Stott cita o respeitável Lloyd Jones: “A fé é basicamente o ato de pensar, e todo problema de quem tem uma fé pequena é não pensar. A Bíblia está repleta de lógica, e, de forma alguma, devemos pensar que a fé seja algo meramente místico. A fé cristã é, em sua essência, o ato de pensar. É insistir em pensar quando tudo parece estar determinado a nos oprimir e a nos pôr por terra, intelectualmente falando.”

1. O risco da super-espiritualidade

Francis Schaeffer chama de super-espiritualidade a tendência de alguns avivados em desprezar o intelecto, a apologia, o corpo e a cultura, para dar ênfase ao espetacular e ao extraordinário. Para ele, “nós estamos no meio de outra luta titânica entre a falsa espiritualidade e a fé cristã equilibrada”. Já que um extremo sempre provoca outro extremo em direção contrária, um dos perigos da super-espiritualidade é que ela pode provocar uma valorização exagerada do intelecto.

2. O risco da ênfase demasiada em aparições e visões

Quase todas as seitas heréticas tiveram sua origem em visões espetaculares. O islamismo, a maior religião do mundo depois do cristianismo e a que mais cresce, é fruto das visões de Maomé por volta do ano 600. A mariologia católica romana repousa em grande parte sobre as visões de Lourdes (1858), Fátima (1918) e Meljugorje (1981).

3. O risco da sede demasiada de milagres

Milagres de cura e outros sempre aconteceram antes de Cristo, durante o ministério de Jesus e dos apóstolos e depois de Cristo. Mas não são os únicos meios de se chegar à verdade, porque eles existem também fora do ambiente cristão, como a história bíblica revela (Êx 7.11 e 22; 8.7) e como Jesus mesmo ensina (Mt 7.21-23). O Apocalipse registra que a besta que emerge da terra curará a ferida mortal da besta que emerge do mar, fará descer fogo do céu à terra e comunicará fôlego à imagem da besta (Ap 13.11-18). Há caso de curas verdadeiras no protestantismo histórico, no protestantismo pentecostal, no catolicismo tradicional, na Renovação Carismática Católica e no meio não cristão. A revista “Newsweek” de 1º de maio de 2000 relata a ocorrência de milagres e curas no catolicismo, no pentecostalismo, no judaísmo, no islamismo, no hinduísmo e no budismo. O Papa acaba de ir a Portugal para agradecer à virgem de Fátima o milagre que o teria salvo do atentado de 1981. O jornal “Gotas de Luz”, da Igreja Messiânica Mundial do Brasil, publica o testemunho do médico angolano que se tornou messiânico por ter sido curado de grave doença em novembro de 1999.

4. O risco de demasiada dependência de emoções

Emoção não é pecado. É uma reação natural frente ao prazer e ao desprazer. O cristianismo é uma fonte de emoções. Há uma porção enorme de experiências que provocam emoções: a descoberta de Deus, a aceitação do evangelho, o perdão de pecados, a prática da comunhão com Deus e com os irmãos, o fruto do Espírito (amor, alegria, paz etc.), a prática do desabafo espiritual, o exercício da esperança e assim por diante. O verdadeiro cristão não é seco. Ele vibra, alegra-se e também chora. Todavia, o crente não deve ser movido a emoções. As emoções falham muitas vezes. São circunstanciais. Dependem com freqüência de um belo dia, de um bom estado de saúde, de companhia, de boas notícias. A vida vitoriosa não pode depender das emoções. Ela precisa depender da autoridade da Palavra de Deus. Se as emoções falham, a Palavra não falha, pois quem faz as promessas é “o Deus que não pode mentir” (Tt 1.2). O crente movido a emoções é volúvel, instável e vítima de arroubos e depressões constantes. A ordem certa, como diz F. B. Meyer, é fato (o que a Bíblia diz), fé (apropriação das promessas de Deus) e emoções (conseqüência natural, imediata ou posterior). Não é necessário, por exemplo, esperar uma agradável sensação para se ter certeza do perdão depois da confissão de pecado. Basta valer-se da promessa de que “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 Jo 1.9). Colocar o sentir antes do crer nas promessas de Deus é o mesmo que tentar construir o último andar de um edifício sem ter lançado os alicerces. O ambiente carregado de emoções, às vezes premeditada e artificialmente, facilita o reavivamento, mas não lhe dá profundidade nem base teológica suficiente.

5. O risco do fanatismo

A distância entre o zelo e o fanatismo não é muito grande, mas a diferença entre um e outro é gigantesca. O Espírito nos leva ao zelo, ao entusiasmo, à plena submissão, à devoção total, ao desprendimento, mas nunca ao fanatismo. O fanatismo depende de renúncia do bom senso e do equilíbrio religioso. Winston Churchill dizia que um fanático “é um sujeito que não muda de idéia nem de assunto”. O diabo detesta o zelo dos cristãos, mas adora o seu fanatismo. O fanatismo destrói anos inteiros de serviço abnegado, provoca tragédia, morte e escândalo. O caminho que leva à explosão do fanatismo é sutil, está coberto de peles de ovelhas. Por causa do fanatismo religioso, milhões têm se afastado de vez da fé cristã, horrorizados, aturdidos, enojados e revoltados. Paulo assevera que “Deus não nos têm dado espírito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação” (2 Tm 1.7). Repetidas vezes, Deus ordena ao seu povo (Dt 5.32; 17.11, 20; 28.14) e aos seus líderes (Js 1.17) que não se desviem “nem para a direita nem para a esquerda”.